sexta-feira, 8 de outubro de 2010

interior

AAAAAAAAAAh - escutou-se do outro lado.
Ela era uma menina loira. Era uma menina boba, rouca e um pouco louca.
Lá fora, algumas pessoas caminhavam, outras aceleravam os carros, viam-se crianças voltando da escola, velhinhos entrando pela porta do fundo do ônibus. Uns andavam de bicicleta, outros procuravam o táxi.
E ela, da janela, gritava:
- AAAAAAAAAAAh!
A calçada era inclinada. No chão, palavras escritas ao vento. Frases pixadas. Que ao longo do tempo a chuva levaria embora.
A casa era antiga - como ela gostava. Casinha branca com a tinta já um pouco desgastada, janelas que davam nas ruas, nada de portão. A casa não tinha portão. A porta era grande. E ele sempre passava por lá. Olhava para cima. E lá estava ela. Vezenquando de pijama, com o cabelo todo armado. Vezenquando, com o cabelo molhado.
- Gustavo! Ei! Olhe para cá!
Ele levantou a cabeça.
- Não vejo nada, querida.
- Você está ficando cego?
- Não! Os raios do sol estão misturando seus traços, meus olhos ficam sensíveis. Não vejo nada além da luz.
- Mas olhe para cima, Gustavo. Você não me olha mais. Você nunca mais me olhou.
- Eu te olho todos os dias, por todos os lugares que vou.
- Me olha?
- Te olho e te vejo. Mesmo quando não está.
Naquela cidade, algo mágico acontecia todos os dias. As pessoas sabiam olhar. A harmonia gritava.
Não era necessário ver para crer.
Silêncio - escutou-se por todos os lados.

3 comentários:

Adriana ♣* disse...

saber olhar faz toda diferença e é essencial!
bjs

Leo disse...

se olha é porque vê, mas não com os olhos...

Beijos!!!

Matheus Marins Alvares disse...

"E ele sempre passava por lá. Olhava pra cima. E lá estava ela. Vezenquando de pijama, com o cabelo todo armado. Vezenquando, com o cabelo molhado..."
gosto do seu jeito simples de escrever.